terça-feira, 24 de junho de 2008

"Ansiedade", mas não é meu... caiu do céu!

A modernidade fez com que todos os meus papeis fossem transformados em arquivos. Nada mais de lembretes, versinhos, testículos (de textos pequenos) ou coisas assim em papel. Tudo é arquivo devidamente arquivado, desorganizado em uma organização própria dentro de um notebook.
Hoje quando procurava por um e-mail achei um outro que nem me lembrava. Retirei o texto não sei de onde e como não deixei marcas, não sei qual foi seu ilustre autor. Seja de quem for, se souberem, me informem para dar devido crédito, afinal não é meu, mas adorei reler isso hoje.
É engraçado, tem coisas que fazem tanto sentido para nós em certos momentos e caem assim, do céu...

Ansiedade

O asco que me corrói a vida; esta boca amarga; esta saliva de mistura com areia que eu tenho de engolir; um cheiro ruim me invade as narinas e eu não vejo para onde escapar porque, para onde eu for, ali estou eu com meus mil anos entalados no peito, atando um nó que me tira o ar e, em desespero, sinto-me sufocado, capaz de,em fração de tempo, cometer os piores desatinos, motivado por essa coisa que me nega a razão.
Estou só e minha solidão nutre a insegurança e o medo cresce; aborreço-me de qualquer presença, embora compreenda que, só por ela, eu consigo acalmar essa ventania que me torce os nervos e se enrola dentro de mim, parecendo levar os órgãos do estômago a se dispersarem num vôo para lugar algum.
Estou só; os de fora não entendem a singularidade de minha apatia; ela cresce em descrença de tudo; por vezes me vem uma sombra, um desejo de antecipar o tempo, numa explosão vazia. Não faço isso enquanto houver unhas para roer, até que alguém me ridiculariza pelo estrago.
Bem que eu podia ficar sem essa; sinto-me ofendido e transfiro meu tédio para o ofensor; não conhece meu drama; centro nele meu asco amargo e me esqueço de mim mesmo... então percebo o início de uma mudança; foi tão simples; foi apenas um locomover da mente, uma alteração de foco. Passada a sexta-feira santa, eu já encaro a vida com olhos de sábado de aleluia. O que aconteceu comigo? Ah! Já sei: foi apenas o esquecer de mim mesmo; foi apenas um desvio da mente para outro lado.
Eu teria me livrado de tudo aquilo se tivesse feito convergência no coração, porque ali está a cura de todos males. Entendo agora aquela máxima, segundo a qual “o coração tem razões que a própria razão desconhece".

domingo, 22 de junho de 2008

Colagem de quem morre aos poucos... será?

Morrer exige um bocado de vida, de vivência.
Não faz sentido? Leia a mais esta colagem de texto do querido amigo Manoel Nery!

A morte de mim mesmo


Há muito tempo sim, venho morrendo. Cada abdicação é um ato de morrer. A abdicação não é morte que aniquile; é morte que vivifica.
Se temos consciência de que em nós, outros valores fazem morada, é preciso que os consideremos no conduzir nosso destino. No convívio desses valores, precisamos abdicar da palavra e dos pensamentos; esses dois abdicares são os requisitos que encontram afinidade com a morte.
Não abdico dos bens porque não os tenho; mesmo se os tivesse, não me teria prendido a eles; não são os bens que nos dissipam; nós é que nos dissipamos pela obsessão com que os preservamos.
Se eu vou precisar fazer uma prova na faculdade, eu preciso estudar, preparar-me; por que não adotar o mesmo critério se a morte é uma prova? De maneira que minha abdicação seja um ato de adaptação ao que está por vir.
Morro todo dia na minha condição de recluso; morro todo dia e a solidão vem me cochichar segredos de outras instâncias, onde a sabedoria é cantora mestra; fico motivado por aderir-me ao coral dos espíritos que souberam afinar-se nos diapasões de outras plagas. Ali a sabedoria dá o tom e as vozes se espalham pelos recantos do sem-fim.
Deixo meu testamento composto de intenções; é só pegar e registrar como de cada um; os herdeiros serão aqueles a quem servirem os bens de meu testamento.
Deixo minha alma entre amigos; ela será testemunha de que não soneguei o saber, já porque nada sabia.
Por fim peço a meus amigos que, se encontrarem algum espólio de mim em seu coração, dividam com outros; que a semente se propague de geração em geração.


Fora disso, é o vazio em que já vivo, celebrando a cada dia a morte de mim mesmo.